Crítica – Rogue One: Uma História Star Wars

Com um final satisfatório e que elimina qualquer eventual dúvida ou questionamento futuro, Rogue One: Uma História Star Wars mostra que estes filmes que enriquecem o universo da franquia são bem-vindos e, se bem realizados, serão bem recebidos. Evidencia o caminho certo que a Disney está tomando em relação à saga e só deixa o fã mais ansioso para saber o que os próximos filmes reservam.10 min


[SEM SPOILERS]

Sinopse: Após a descoberta da construção da arma suprema do Império Galáctico, a Estrela da Morte, a Aliança Rebelde se mobiliza para saber onde está o engenheiro-chefe da estação bélica, Galen Erso (Mads Mikkelsen), que possui informações vitais para o sucesso dos rebeldes. Jyn Erso (Felicity Jones), filha de Galen, é enviada para encontrar a única pessoa que sabe do paradeiro de seu pai, Saw Gerrera (Forest Whitaker), juntamente com o capitão Cassian Andor (Diego Luna) e o dróide reprogramado do império K-2SO (Alan Tudyk). Durante a missão se juntam a eles o guerreiro crente na Força Chirrut Imwe (Donnie Yen), seu amigo Baze Malbus (Jiang Wen) e o piloto desertado do Império Bodhi Rook (Riz Ahmed). Enquanto isso, o Diretor Orson Krennic (Ben Mendelsohn), responsável pela construção e operação da Estrela da Morte, tenta garantir que a operação da estação bélica ocorra de acordo com o planejado e garantindo, assim, prestígio perante o alto escalão do Império.

Depois que a Disney comprou a Lucasfilm em 2012 o primeiro anúncio feito foi que teríamos uma nova trilogia de Star Wars, os episódios VII, VIII e IX. Até aí nenhuma novidade. Mas o choque veio quando foram anunciados filmes que se ambientariam no universo de Star Wars, mas que não fariam parte do arco principal da história. O primeiro anunciado foi este Rogue One: Uma História Star Wars, sendo que um segundo contando a história do contrabandista mais famoso da galáxia Han Solo foi agendado para dezembro de 2018 e um terceiro, ainda sem tema definido, teve sua estreia marcada para dezembro de 2020. Naquele momento muitos fãs, incluindo eu, ficaram com o pé atrás. Em um primeiro olhar parecia um artifício da casa do Mickey para capitalizar ao máximo em cima de um produto que ela havia pago US$ 4,0 bilhões para utilizar. Mas no meio do processo Star Wars – O Despertar da Força (2015) estreou, foi um sucesso de público e crítica, faturou mais de US$ 2,0 bilhões em bilheteria mundialmente, mais incontáveis bilhões com o licenciamento de produtos e deixou os fãs mais tranquilos. A Disney estava cuidando com muito carinho da franquia criada por George Lucas. Mesmo assim, a campanha de marketing deste Rogue One demorou a engrenar e a expectativa em cima do longa era alta, mas nada comparado ao filme de 2015. Para a sorte de todos nós, Rogue One: Uma História Star Wars é um acerto quase completo e preenche uma lacuna que os fãs nunca pareceram achar que precisavam saber, mas que valoriza ainda mais a Trilogia Clássica (1977-1983), principalmente Star Wars – Episódio IV: Uma Nova Esperança (1977).

O diretor escolhido para contar a história deste Rogue One também causou certos receios. O britânico Gareth Edwards é tido como um dos mais promissores diretores em Hollywood, mas seu último trabalho Godzilla (2014) é um filme fraco, possui um clima construído com muita eficiência, mas na hora das coisas de fato acontecerem falta ritmo, falta impacto e o elenco principal não ajuda. Mas foi a escolha da Disney para o primeiro filme derivado de Star Wars. E aqui Edwards apaga a má impressão de seu último trabalho e se estabelece, de fato, como um dos diretores que serão mais procurados nos próximos anos. A energia misturada com a sensação de urgência que o diretor consegue colocar neste Rogue One fazem com que o espectador consiga aproveitar cada segundo de projeção e consiga ter noção da importância dos feitos que aqueles rebeldes estão realizando. Há algumas ótimas escolhas de Edwards. A primeira, mais óbvia e esperada, é encher o filme de referências aos outros filmes da saga. De cinco em cinco minutos algo é citado ou mostrado levando o espectador que é fã de Star Wars a ter aquela sensação de satisfação dentro de si. Sabem aquele meme do Capitão América dizendo todo satisfeito que pegou a referência citada? Este é o fã de Star Wars assistindo a Rogue One. Os mais chatos vão dizer que nem todas as referências mostradas no filme fazem a história se movimentar e isso é verdade. Mas tem outro fato ainda mais concreto: Rogue One é feito para os fãs da velha guarda de Star Wars e, para eles, referências nunca são demais. Outro acerto do diretor é colocar o nome dos planetas e luas no canto inferior esquerdo da tela assim que eles aparecem pela primeira vez. Nunca antes nos filmes da franquia tantos mundos inéditos foram mostrados, sendo que muitas vezes a narrativa acaba acontecendo em até três locais ao mesmo tempo, o que causaria uma certa confusão até no espectador mais atencioso. E o mais curioso, certamente feito de propósito pelo diretor, é que o planeta que mais o espectador queria ter certeza qual era não teve o seu nome revelado, embora fique meio claro que, pelas características do local, seja o mesmo planeta que foi apresentado em Star Wars – Episódio III: A Vingança dos Sith (2005).

Rogue One consegue apresentar conceitos que antes estavam relegados ao Universo Expandido da franquia, seja ele canônico ou não. Finalmente os cristais Kyber são citados em um filme de Star Wars e tem a sua importância evidenciada. Afinal, os cristais que são a principal fonte de energia dos sabres de luz dos jedi já mereciam ter sido estabelecidos nos cinemas anteriormente. Pela primeira vez nos filmes o espectador consegue enxergar o culto à Força como de fato uma religião daquele universo. Se antes os jedi, que não aparecem neste filme, eram os únicos representantes da religião apresentados, agora temos mais personagens que, embora não controlem a Força, são devotos a ela às suas próprias maneiras. Fica evidente para o espectador médio, aquele que não acompanha Star Wars em todas as mídias, que os jedi são o braço armado da religião, mas ela existe além deles.

A dinâmica do longa funciona de maneira a não deixar o ritmo cair. Os personagens estão sempre em movimento, a não ser nas reuniões da Aliança Rebelde, e a sensação de urgência é latente. Fica claro que os rebeldes estão correndo contra o tempo e que qualquer atraso pode custar vidas. Dessa maneira o espectador se vê emocionalmente envolvido com os personagens e, principalmente, com a história que está sendo contada. Rogue One é essencialmente um filme de guerra em que muito está em jogo e vidas são perdidas. E, nesse sentido, o longa merece destaque pela coragem de mostrar que nem tudo é preto ou branco, bom ou mau. Há uma zona cinza em que muitos personagens transitam, inclusive os mocinhos rebeldes. Quando Cassian toma determinada atitude com um de seus informantes primeiro o espectador se choca, mas depois ele entende como algo perfeitamente plausível em qualquer realidade de guerra. É Star Wars atingindo a maturidade temática que George Lucas lhe negou com atitudes como a versão corrigida de Star Wars – Episódio IV: Uma Nova Esperança (1977) em que Han Solo não atira primeiro. Mais do que nunca a Aliança Rebelde é mostrada como uma organização que, ao mesmo tempo em que precisa estar um passo a frente do Império, precisa lidar com a sua burocracia interna, onde diversos indivíduos possuem opiniões opostas e só o consenso pode levar ao sucesso.

Embora seja um filme redondo, Rogue One possui algumas falhas. A principal delas está no desenvolvimento de seus personagens. O único que tem um arco emocional mais delineado é Cassian, sendo que seus companheiros praticamente entram no filme e saem dele da mesma maneira. Jyn até possui alguma evolução, mas não é orgânica. Algo parecido com o Thor aprendendo a ser humilde passando só três dias na Terra no seu longa de 2011. Particularmente, eu entendo este Rogue One mais relevante levando-se em conta a história que está sendo contada e não quem a está contando. O núcleo principal de rebeldes é apenas um meio para se chegar a um fim. Então não me fez falta o não desenvolvimento dos personagens, mas é algo que pode incomodar os mais exigentes. Outros problemas mexem mais com o meu lado fã do que o meu lado crítico. Nunca antes Darth Vader esteve tão franzino, parecendo mais um cosplay de Darth Vader que você encontra em eventos. Ficou estranho. Ele está mais magro, pequeno. Não agrada. Embora a sua sequência final seja absolutamente sensacional e faça com que o fã saia da sessão mais extasiado ainda. Sua primeira sequência também é significativa por mostrar que ele não vive na armadura o tempo todo, o que evidencia ainda mais a fragilidade da saúde de Anakin Skywalker. Rogue One também deixa um gosto amargo ao colocar a Estrela da Morte em ação. Por mais que não tenha destruído de fato nenhum planeta neste filme, a ideia que é passada no episódio IV é que a primeira vez que a estação bélica é acionada é quando Alderaan é obliterada. O próximo ponto negativo trás um spoiler consigo, então quem ainda não assistiu ao filme deve pular para o próximo parágrafo. Soa estranho que a Princesa Leia tenha ficado a bordo da Tantive IV durante toda a batalha na órbita de Scarif sem ter partido para a ação ou tenha tido uma participação mais ativa no conflito. Não condiz com a sua personalidade. O filme dá a entender que a Princesa ficou esperando pacientemente a chegada dos planos da Estrela da Morte para poder partir.

Tecnicamente o filme é um primor. A trilha sonora trás elementos da franquia, mas Michael Giacchino dá uma identidade própria a ela, deixando claro que não se trata de um filme da história principal, o que também é evidenciado na ausência do clássico letreiro inicial. A trilha sonora consegue conduzir bem o longa, pontuando bem as sequências de ação e nunca pendendo para o excesso mesmo em momentos em que isso seria aceito. A fotografia é exuberante, com destaque para a lua de Jedha, uma espécie de Jerusalém dos jedi, e para o paradisíaco planeta Scarif. Não há momentos brilhantes como o pôr-do-sol de Tatooine ou o duelo de sabres entre Rey e Kylo Ren, mas a fotografia consegue valorizar muito bem os ambientes e situações. A montagem é correta e não deixa o espectador ficar perdido mesmo a narrativa passando por muitos planetas e luas, como citado anteriormente. As sequências de ação não são freneticamente cortadas, possibilitando que todos entendamos a geografia do ambiente e a localização de cada personagem em cena. A maquiagem está excepcional, com destaque para os seres alienígenas que passam pela tela. E, sabiamente e dando coesão à franquia, os personagens humanos da Aliança Rebelde possuem cabelos e bigodes iguais aqueles usados na década de 70 quando o primeiro filme foi lançado. É só um detalhe, mas dá uma sensação de unidade aos filmes que agrada. Os efeitos especiais estão excelentes e na medida certa e é difícil identificar um momento que tenha sido utilizado o chroma key, o que já eleva o valor de produção do longa. Mesmo na batalha na órbita de Scarif que necessita de muitos efeitos especiais, o diretor Garreth Edwards consegue dosar de maneira eficiente, não parecendo nada gratuito. O famoso ‘faço porque posso’ que George Lucas utilizou muito na Nova Trilogia (1999-2005) não está presente aqui. Se o efeito especial foi utilizado é porque ele foi necessário para aquela sequência. Merece destaque a utilização de efeitos especiais para a recriação de dois personagens. Um deles não vou dizer qual é para não estragar a surpresa, mas adianto que o efeito não ficou bom, dando uma sensação de alta artificialidade ao rosto do personagem, parecendo um boneco de borracha. Já a recriação de Grand Moff Tarkin ficou competente, embora não perfeita. O ambiente escuro dos corredores da Estrela da Morte ajudam a esconder as imperfeições do personagem digital, parecendo crível ao espectador. Era um personagem necessário para a história, que precisava estar lá porque estava no episódio IV, mas que, devido a morte do seu intérprete Peter Cushing em 1994, só tinha um jeito de estar presente neste novo longa. A direção de arte é eficiente ao retratar e enriquecer os ambientes. Tirando a Estrela da Morte e Yavin IV que os fãs já conheciam, ambientes como a base de dados do Império Galáctico no planeta Scarif saltam aos olhos pelo que está sendo exibido. Para agradar aos fãs, novas naves são apresentadas, principalmente da Aliança Rebelde, mais uma vez expandindo o já rico portfólio da saga. 

O elenco está homogêneo e competente, embora ninguém brilhe, mas também ninguém compromete. Felicity Jones está bem como a principal personagem do longa. Sua Jyn Erso é rebelde, insubordinada e ativa, e a atriz consegue transmitir exatamente que Jyn possui sentimentos conflitantes em relação ao pai. A entrega física de Felicity também agrada, já que o papel exige isso. Fica evidente os esforços da Disney para dar mais destaque às mulheres na saga. Se Rey sendo a principal personagem da nova trilogia era uma dica disso, Jyn Erso confirma essa nova linha de pensamento do estúdio. Diego Luna consegue transmitir a dubiedade de seu personagem de maneira orgânica e, mesmo assim, não ganha a antipatia do espectador. É um personagem interessante, cheio de amarguras e com um passado que nos deixa curioso para conhecer. Mads Mikkelsen aparece pouco em cena, mas o ator consegue fazer valer cada segundo. A presença de tela Mads é enorme e o espectador consegue entender perfeitamente porque o personagem fez o que fez, conseguindo sentir até certa afeição por ele. Forest Whitaker interpreta um dos personagens mais interessantes do longa. Um veterano das Guerras Clônicas, um extremista rebelde que assusta até a Aliança pelos seus ideais e métodos. Infelizmente o personagem parece ter muito mais o que contar do que de fato o faz. Mesmo assim, o ator consegue dar peso ao personagem, impondo respeito e impressionando pela sua voz e pela sua ótima caraterização. Donnie Yen ganha a simpatia imediata do espectador por interpretar o personagem mais parecido com um jedi que temos neste filme. O físico do ator, somado ao seu carisma fazem o personagem ter alguns dos melhores momentos e diálogos do filme. Jiang Wen interpreta um personagem que tem pouco destaque no grupo, mas seu imponente porte físico agrega, sendo basicamente um guarda-costas de Chirrut. Riz  Ahmed está carismático como o piloto do Império que deserta para o outro lado. Sua fala rápida e seu físico pequeno combinam com o personagem, que é sempre o responsável por livrar os rebeldes de problemas. Alan Tudyk dubla o dróide K-2SO, o personagem mais sem filtro de toda a saga. Tudyk consegue colocar nuances em suas falas que fazem do dróide um personagem engraçado e irônico, que também rapidamente ganha o público. Ben Mendelsohn interpreta um vilão que pode decepcionar certos espectadores pela expectativa criada. De fato o Diretor Krennic é importante e sem pudores, mas ele ameaça mais pelo o que ele pode mandar alguém fazer do que pelo que ele vai fazer de fato. Mendelsohn coloca uma pitada de insubordinação, misturada com muita bajulação em um personagem que é mais um burocrata do que qualquer outra coisa. 

Com um final satisfatório e que elimina qualquer eventual dúvida ou questionamento futuro, Rogue One: Uma História Star Wars mostra que estes filmes que enriquecem o universo da franquia são bem-vindos e, se bem realizados, serão bem recebidos. Evidencia o caminho certo que a Disney está tomando em relação à saga e só deixa o fã mais ansioso para saber o que os próximos filmes reservam.

NOTA: 9,0

[youtube]https://www.youtube.com/watch?v=R74QIAaRuEg[/youtube]

 

INFORMAÇÕES
Título: Rogue One: Uma História Star Wars (Rogue One: A Star Wars Story)
Direção: Garreth Edwards
Duração: 133 Minutos
Lançamento: Dezembro de 2016
Elenco: Felicity Jones, Diego Luna, Mads Mikkelsen, Forest Whitaker, Donnie Yen, Jiang Wen, Riz  Ahmed, Alan Tudyk e Ben Mendelsohn.


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